dezembro 21, 2025
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Numa igreja ao norte da Cidade do México, uma oração está sendo difundida entre os participantes de uma celebração em honra da Virgem de Guadalupe: “Senhor Jesus, diante das graves ameaças que vivemos hoje no México, devido às propostas de leis que ameaçam a fé que nos revelaste, à polarização política e à violência geral, pedimos a tua intervenção para evitar que o México caia na armadilha da cultura do silêncio, da mentira e da morte que estas ameaças impõem”. A congregação repete isso em uníssono. As reivindicações sociais por maior segurança do país encontraram o seu lugar no zelo dos fiéis católicos, que entregaram os seus maiores problemas às mãos do padroeiro dos mexicanos. A oração caminha na linha que divide o território político e espiritual. “Santíssima Virgem de Guadalupe, Rainha do México, salve nosso país e defenda nossa fé”, soa na igreja. Nessa mesma semana, a Presidente Claudia Sheinbaum reconheceu que um pedido para que o Papa Leão XIV visitasse o México no próximo ano como um actor importante na luta contra a violência tinha sido transmitido ao Vaticano.

Um veredicto sem remetente põe fim a uma série de questões polêmicas na vida pública. As mulheres que dirigem os cultos de oração atribuem a autoria ao pároco, que não foi contactado. Esta prática não é apoiada pelas autoridades eclesiásticas, mas também não é proibida. A Conferência do Episcopado Mexicano (CEM) nega qualquer envolvimento nisso, mas não vê nenhum erro nas suas expressões. “Esta é uma iniciativa de rezar por aquilo que magoa as pessoas. Quem escreveu isto reflete os sentimentos de muitos mexicanos”, disse Monsenhor Hector Mario Perez Villarreal, bispo auxiliar do México, porta-voz da Igreja Católica no México.

Na Basílica de Guadalupe, o santuário mariano mais importante e visitado do mundo, a cada hora começa uma ação litúrgica igual ao número de sermões que os sacerdotes dirigem aos presentes, traçados na mesma linha. “Quando parece que o mundo está desaparecendo porque vivemos um momento de decepção, de incerteza, porque não há trabalho…”, diz o clérigo em uma mensagem de conteúdo semelhante sobre as deficiências do povo mexicano. Para o vice-diretor de Rádio e Televisão da Arquidiocese do México e sacerdote da Arquidiocese do México, José de Jesus Aguilar, estas expressões são naturais e respondem aos protestos dos fiéis. “Na basílica todas as situações que a sociedade enfrenta são acolhidas. As pessoas pedem um emprego, o regresso de uma pessoa desaparecida, para que haja justiça. Quem preside acolhe todos estes pedidos e faz com que as pessoas sintam que as suas necessidades são ouvidas, que se sintam acolhidas, que sintam que a Igreja está a responder aos seus medos e necessidades”, afirma o monge.

A oração a Nossa Senhora de Tepeyac pela pátria e pela fé eleva o tom. “Senhor, infunde em nós, Teus filhos, um espírito de unidade para a salvação do México”, conclui a oração, que, segundo Perez Villarreal, “reflete os reais interesses dos católicos mexicanos”, mas não é a voz da Igreja. A petição permanece anônima e as autoridades atribuem sua circulação aos crentes. “Você vê um cidadão mexicano, católico, expressando a dor que sente pelo que está acontecendo no México”, diz o porta-voz. A ideia de que tenha vindo de um ministro religioso também não é motivo de indignação, argumenta: “Mesmo que tenha vindo de um padre, ele não diz nada que seja contrário à doutrina. Pede à Virgem de Guadalupe que defenda os problemas do México, não está a falar de nenhum partido”, acrescentou o prelado.

Uma oração de origem desconhecida conseguiu refletir a posição da Igreja sobre questões atuais. A apresentação de propostas de reforma pelo partido no poder prejudicou mais do que se podia notar as relações com a Igreja, por exemplo aquelas que restringem a liberdade de opinião dos religiosos, o que atraiu a atenção do público, tanto que Arturo Ávila, representante de Morena no Congresso mexicano, retirou a sua proposta que obrigaria padres, pastores e ministros religiosos que divulgam conteúdos em redes sociais ou plataformas multimédia a registarem-se e reportarem o seu conteúdo ao Ministério do Interior e à agência Digital. O argumento para a reforma pretendida e rejeitada foi a propagação do discurso de ódio na esfera religiosa. “A oração diz respeito a leis que ameaçam a fé, como a recente lei Arturo Ávila, à confusão causada pela ideologia de género tão embutida nos livros escolares, à polarização política evidente, à violência generalizada”, defende o porta-voz.

A defesa foi realizada em todas as frentes. “A Igreja tem uma opinião própria, isso não significa que interfira nos partidos políticos, apenas analisa a realidade”, enfatiza Aguilar. Nas paróquias de São Cosme e São Damião, para onde o padre envia, não foram entregues folhetos ou postais, mas há uma agitação geral, comentou. “Todos esperam que o governo, seja de qualquer partido, resolva esta situação e não só culpe os governos anteriores, mas também enfrente o momento atual.”

No mesmo templo foi inaugurada a escultura de uma águia e uma cobra, símbolo da bandeira mexicana. “Significa convidar as pessoas a lembrarem, antes de entrarem na Igreja, que devemos sempre pedir pelo nosso país, ter orgulho dele e compreender que não pode avançar sem o compromisso dos mexicanos e dos fiéis”, detalha Aguilar. Há também a figura de uma mulher coberta por um xale, ajoelhada, rezando e procurando algo. “O país está chorando por seus filhos”, intitularam. Uma homenagem aos desaparecidos e às suas famílias que os procuram incansavelmente. “A história nos influencia; o católico está no chão, no chão que o machuca neste momento”, conclui o porta-voz sobre a mensagem que está circulando entre os paroquianos e que eles esperam que ressoe no topo.

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