novembro 14, 2025
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“Para quem devo ligar se quiser falar com a Europa?” Esta frase carregada de sarcasmo é atribuída a Henry Kissinger, chefe da diplomacia americana durante a administração Nixon e um dos maiores estrategas da Guerra Fria, e refere-se à fase em que a União Europeia estava a ser construída.

Hoje, em Santa Marta, a cidade mais antiga da América Latina, a questão poderia ser formulada de forma ideal para a região, embora com muito menos urgência, à medida que os europeus se apercebem de como é difícil chegar a um consenso. Para quem ligar? Para o bloco de Lula, Borich e Peter? Eles são um bloco? Em Bukele, Miley ou Noboa? Geri ou Rodrigo Paz? Pode não ter existido uma região tão fragmentada nos últimos 30 anos (“Tornamo-nos uma região balcanizada e dividida”, disse Lula). E dos nomes próprios mencionados, apenas o líder colombiano, anfitrião do evento, e o brasileiro compareceram à cúpula da CELAC e da UE. Foi uma presença muito poderosa, não em carne mortal, mas em espírito, a presença de Donald Trump.

No meio da escalada de tarifas, do conflito crescente sobre ataques de mísseis a navios de droga e da aplicação total de políticas nacionais (como aconteceu com o Brasil ou a Argentina), a declaração não menciona os Estados Unidos porque tornaria difícil a assinatura de muitos países.

O desejo de reaproximação transatlântica encontrou impulso em Trump, mas isso não é suficiente para superar as tensões internas em cada região. Há alguns meses, o político espanhol Ramon Jauregui, presidente da Fundação Euro-América, defendeu a possibilidade de preparar uma proposta sobre questões migratórias para a América Latina e o Caribe no âmbito desta cimeira. À medida que a mobilidade humana estagnava em direcção aos Estados Unidos e à necessidade da Europa pelas mesmas pessoas, Jauregui defendeu a abertura de consulados para uma imigração ordenada. Com excepção de Espanha, a Europa de hoje parece relutante em iniciar esta conversa.

A declaração final da cimeira incluiu um parágrafo geral sobre a “importância do reforço” da cooperação na “gestão da migração, incluindo os processos de regresso, e recordamos o nosso compromisso de aprofundar a cooperação e o diálogo sobre questões de migração e mobilidade de uma forma abrangente, equilibrada e integrada (etc.).” Também foram assinados um pacto sobre as cidades e outro sobre a segurança dos cidadãos. “Temos que trabalhar em tudo, mas talvez seja melhor concentrarmo-nos em duas ou três coisas, esta é uma cimeira onde se discutiram muitas coisas”, disse sexta-feira o diplomata no hotel onde os líderes se reuniram. E isso é verdade, mas ainda é uma ausência perceptível, embora menos óbvia.

“Apesar de haver aqui países com orientações ideológicas muito diferentes, conseguimos ter uma posição comum sobre as questões mais importantes do nosso tempo”, afirmou o presidente do Conselho Europeu, António Costa. Os compromissos ambientais reforçaram-se, houve apelos para abordar a tendência autoritária na Nicarágua e na Venezuela (sem nomeá-los) e uma forte defesa do multilateralismo que já não parece trivial. Porém, na parte econômica, quando se fala da assinatura definitiva do acordo com o MERCOSUL e de grandes investimentos, falta algo mais específico no que diz respeito à mobilidade laboral.