novembro 22, 2025
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Ao enfrentar um golpe na vida, como uma perda inesperada, um rompimento ou uma decepção, uma pessoa pode se sentir como um navio à deriva em um mar tempestuoso. Essas situações, que costumam levar ao que a psicóloga Ana Belen Medialdea define como naufrágio emocionalsão os que ele aborda em seu livro The Light That Is In You (Zenith), uma jornada de reconstrução pessoal repleta de metáforas baseadas em sua própria história após a morte de seu pai; bem como as pessoas que ele acompanha nas consultas.

Seu trabalho é baseado na história da perda de seu pai…

— Sim, queria compartilhar isso porque escrever me ajudou muito ao longo da minha vida. Sempre quis mostrar a importância da resiliência através do que aconteceu depois de perder meu pai. E quando tive coragem de fazer isso, percebi que esse assunto era um tabu na família.

Você queria derrubar esse tabu em seu ambiente?

“Tentei dar ao meu pai o lugar que antes não havia dado a ele, mas também queria dissipar os falsos mitos que circulam em torno da terapia estratégica de curto prazo, método com o qual sempre trabalhei.

“Você vai ao psicólogo para aprender a sofrer, não para parar de sofrer”

Ana Belén Medialdea

Psicólogo

Que mitos sobre esse tipo de terapia estão errados?

“Podemos assumir que esta é uma terapia superficial que permanece superficial. É criticada por focar no sintoma e não abordar a raiz do problema. No entanto, este modelo terapêutico ajudou-me a integrar pessoalmente um acontecimento trágico que mudou para sempre a vida da minha família. E embora esta cicatriz esteja sempre comigo, já não dói. E isto é algo que também pude testar em muitos pacientes que ajudei.

Mas então não permanece superficial…

– Não, na verdade para mim a profundidade está justamente em integrar algo difícil que aconteceu no passado para que deixe de ter um poder tão grande no presente. Trata-se de deixar o passado no passado para que possamos continuar avançando.

O que acontece quando você finge que está tudo bem, mesmo se sentindo quebrado por dentro?

— A coisa mais comum que acontece quando ocorrem mudanças difíceis é fingir que está tudo bem com você. É a maneira que o cérebro tem de processar o que está vivenciando e, de certa forma, pedir uma pausa para integrar tudo e poder enfrentá-lo. O problema surge se você permanecer neste estágio porque isso o esgota emocionalmente, causa ansiedade e desperdiça energia tentando fazer tudo. A consequência disso é um risco aumentado de desenvolver depressão.

Geralmente é difícil pedir ajuda?

— Há uma parte da autoexigência que insiste que você deve ser capaz de fazer tudo e resolver esse problema sozinho. Mas pedir apoio e permitir que outros nos ajudem a suportar este fardo é um ato de amor próprio.

“Falar muito e com frequência sobre a tristeza que você sente não ajuda a digeri-la, mas a perpetua.”

Ana Belén Medialdea

Psicólogo

O que é o naufrágio emocional e como ele é vivenciado?

“Essa é uma metáfora que uso para descrever aquele momento da vida em que você não sabe para onde ir porque acha que está tudo errado, quando você não tem confiança. E embora a vida seja incerta, você pode vivenciar momentos de estabilidade e calma. Mas se você está vivendo uma crise emocional, você se sente perdido, isolado, frustrado, exausto e solitário, mesmo estando cercado de pessoas.

Como isso se manifesta fisicamente?

– Além de se sentir apressado, ansioso e de não ter tempo para nada, o rejeitado emocional costuma ter dificuldade para dormir, comer qualquer coisa ou até usar a comida para acalmar as emoções. Eles também tendem a ser muito sensíveis ou instáveis: choram com frequência, ficam com raiva facilmente ou ficam confusos com coisas aparentemente simples.

Em seu livro, ele explica que não são as emoções que machucam, mas a resistência a elas..

— A verdadeira força reside na capacidade de mostrar vulnerabilidade. Quando uma pessoa resiste a demonstrar emoções é porque não quer que os outros a vejam vulnerável, porque isso a faz sentir-se nua diante dos outros e pensar que perderá o controle de si mesma. E é ainda mais frustrante se você mora em um ambiente que não oferece segurança. Se não quiser sentir, você pode fazer qualquer coisa para evitar se ouvir. E é aí que o pior começa. É como estar no meio do mar, no meio das ondas, e começar a nadar contra a corrente. Mesmo que você nade o máximo que puder, ou mesmo que tenha a melhor técnica do mundo, você apenas perderá energia e dificilmente conseguirá avançar.

— Seu livro não ajuda a acabar com o sofrimento e não substitui a terapia. Como isso orienta?

— Eles vão ao psicólogo para aprender a sofrer, mas para parar de sofrer. Quando você passa por uma situação difícil, você não consegue parar de sofrer. Se a perda de alguém ou de algo é importante para você, você não pode parar de sentir falta daquela pessoa ou de sentir como é. Mas você pode aprender a administrar esse sofrimento para que ele não dite suas ações ou comportamento. Você também pode impedi-lo de assumir o controle de sua vida.

– Como ajudar um ente querido que está sofrendo?

“Quando vemos alguém que amamos sofrendo, ficamos obcecados em acabar com sua miséria, mas não é isso que o ajuda.” Pedir para ele ficar bem, encorajá-lo, tentar fazê-lo pensar em outras coisas ou ir a algum lugar nem sempre ajuda. Precisamos fornecer apoio emocional real, sem assediar, pressionar ou fazer com que eles sintam que precisam fazer mais do que já fazem.

“Pedir apoio e permitir que eles nos ajudem a carregar esse fardo é um ato de amor próprio.”

Ana Belén Medialdea

Psicólogo

— Quando você fala sobre os estágios do luto, você usa metáforas tão poderosas quanto um iceberg…

– Sim, porque a primeira fase é semelhante a um navio colidindo com um iceberg. Às vezes você vê isso chegando, mas não pode evitá-lo, e às vezes você nem percebe. Este é um momento de choque em que o cérebro precisa de espaço para integrar o que está acontecendo.

— Isso significa superar o trauma?

– Não, porque passar por um momento difícil não significa que seja um trauma ou algo que vai nos deixar marcas. Nem tudo de ruim que acontece na vida é trauma. Na verdade, pode haver dois membros da mesma família que vivenciam o mesmo acontecimento trágico de maneiras completamente diferentes.

– Representa as ondas como metáfora da tristeza…

– Sim, porque às vezes sufoca, afoga e arrasta para baixo. Muitos pacientes que buscam aprender a administrar sua tristeza são pessoas que têm muitos pensamentos repetitivos, que tentam evitar a todo custo o que estão sentindo e que tentam fazer de tudo para evitar serem associados a essa tristeza. Mas isto não é uma solução.

-Por que não?

“Porque se você não der a essa tristeza o espaço que lhe cabe no dia a dia, ela pode invadi-la a qualquer momento.” Por isso costumo aconselhar quem está passando pelo luto e está muito triste a dedicar algum tempo do seu dia a dia, no mínimo 20 minutos e no máximo uma hora, para expressar toda essa tristeza no papel, por escrito. E você terá que chorar também. Já existem estudos que mostram que o choro alivia o excesso de estresse, diminui a pressão arterial, reduz a tensão muscular e tem efeito sedativo e antidepressivo.

É bom falar sobre seus sentimentos com outras pessoas?

– Conversar muito com outras pessoas sobre a tristeza não ajuda a processá-la, mas sim a perpetuá-la. Isto pode ser um alívio no início, mas se essa pessoa explicar constantemente o quão triste ou zangada ela está, ela receberá uma resposta dos outros que de alguma forma retribuirá o que ela está tentando obter ao falar sobre isso. Quando isso é dito cinco ou seis vezes, o interlocutor fica incomodado, tenta tranquilizar com impaciência ou expressa mal-entendidos que aumentarão o desconforto do agressor.

– Talvez seja melhor escrever?

— Sim, a escrita terapêutica permite revelar tudo o que você tem dentro de si. E uma vez que você deixe para lá, a chave para ser eficaz é não folhear ou reler o que você escreveu.

—Outra emoção vivenciada durante o luto é a raiva…

— Sim, no livro eu comparo isso a uma tempestade. A raiva é sentida quando algo parece injusto ou quando uma pessoa se sente desvalorizada ou levada em consideração, ou mesmo quando há uma mudança indesejada de planos. Com a raiva podem acontecer duas coisas: ela explode contra os outros ou contra si mesmo. E se no caso da tristeza o principal é superá-la, então com a raiva devemos canalizá-la para que não nos domine e não nos cegue.

—Qual é o papel do medo?

— O medo nos faz querer evitar coisas que nos tiram da nossa zona de conforto e nos obrigam a mudar. Embora alguém possa querer mudanças, na verdade é assustador. De preferência um mal conhecido, porque é isso que a mente conhece, controla e tem em mãos. Mas para transformar o medo em coragem, você precisa encará-lo de frente. Qualquer coisa que você deixe de fazer por medo, mesmo que pareça um alívio, aumenta sua incapacidade de resistir a qualquer coisa. Além disso, em estudos relacionados à terapia estratégica de curto prazo, notou-se que verbalizar os medos muitas vezes não os reduz, mas sim os aumenta. Gosto de citar o psicoterapeuta Giorgio Nardone, que explica que falar constantemente sobre o medo é como fertilizar uma planta para fazê-la crescer mais.

— Quando é hora de despejar o lastro?

“Tem a ver com abandonar a culpa, o ressentimento, o ressentimento e todas aquelas emoções que nos mantêm presos ao que esgota a nossa energia. Às vezes, sentir-se culpado é uma forma de se tratar mal e de não se tratar com a gentileza que é tão necessária em momentos difíceis.

—O momento do farol mencionado em “The Light Within You” é aquela fase de luto em que você começa a ver a luz…

– Sim, e isso se faz sentir através daqueles procedimentos que nos trazem de volta à vida, nos fazem sentir úteis e nos ajudam a cuidar de nós mesmos. Mas o farol também são todas aquelas pessoas que salvam vidas, que nos apoiam sem julgar e que estão próximas incondicionalmente.

— Como parar de se culpar, julgar e criticar?

“Gostaria de ajudar os leitores a compreender a ideia de que quando você faz algo sem intenção de fazer errado, isso te liberta da culpa, porque é um erro, e não há nada mais humano do que um erro.” A primeira vez em qualquer coisa é apenas a primeira vez, e não se trata de fazer tudo perfeitamente, mas de se permitir cometer erros. Errar é tentar. E a vida é assim: tentar de novo e de novo.