O Ministério do Consumidor anunciou nesta quarta-feira que retirará alimentos ultraprocessados dos cardápios oferecidos a crianças e adolescentes internados em hospitais. “Que não haja controle desses alimentos, com evidências tão extensas de seus impactos, é incompreensível”, disse Pablo Bustinduy, ministro dos direitos sociais, do consumo e da Agenda 2030. A afirmação foi feita durante a apresentação Plano para acelerar a luta contra a obesidadeorganizado pelo Ministério da Saúde e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) nesta quarta-feira. Este veto aos alimentos ultraprocessados será incluído num Real Decreto que visa garantir a alimentação saudável em hospitais e lares de idosos. Porém, o Ministério lembra que será preservada a autonomia do paciente que desejar consumir esses produtos.
O texto em que o Consumo está trabalhando também limitará os alimentos ultraprocessados incluídos nos cardápios infantis dos refeitórios e cantinas abertas ao público nesses centros. As regras seguirão, portanto, o Real Decreto sobre Cantinas Escolares Saudáveis e Sustentáveis, que o governo aprovou em abril de 2025 e que exige que as refeições nas escolas e instituições cumpram as recomendações sanitárias de organizações científicas como a OMS ou a Agência Governamental de Segurança Alimentar e Nutrição (AESAN).
Alimentos ultraprocessados encheram nossas geladeiras nos últimos 20 anos. Assim, de acordo com uma série de revisões científicas publicadas em revista científica, sua participação na dieta alimentar aumentou de 11% para 32%. Lanceta 19 de Novembro. O texto também salienta como este paradigma alimentar, “impulsionado pelo lucro empresarial e não pela nutrição ou pela sustentabilidade”, está a minar a saúde global e apela aos governos para que tomem medidas.
A medida anunciada por Bustinduy (Sumar) vai nesse sentido, pois estabelece critérios mínimos de qualidade nutricional e de sustentabilidade que regem a contratação, aquisição e fornecimento de produtos alimentares e bebidas oferecidos em hospitais e lares de idosos. Na seção Consumo, indicaram que os alimentos ultraprocessados que seriam restritos seriam “alimentos complexos formulados industrialmente, com ingredientes transformados, aditivos e perfil nutricional rico em gordura saturada, açúcar ou sal”, como é o caso de bebidas açucaradas, alguns salgadinhos ou assados e biscoitos industriais.
“Esta resolução é uma resposta ao clamor público, bem como da comunidade científica, bem como às inúmeras queixas apresentadas tanto por cidadãos como por actores sociais e grupos profissionais”, disse o Ministro Bustinduy.
Além disso, sublinhou que o sector público deve liderar a transição para um ambiente alimentar saudável e que o seu ministério será “um pioneiro quando se trata de acção nesta área”, como afirma a OMS. “O aumento do consumo de alimentos representa uma ameaça sistemática à saúde pública, à equidade e à sustentabilidade ambiental”, acrescentou, “e os governos têm a responsabilidade de criar um ambiente onde a tomada de decisões saudáveis seja fácil e acessível”.
Organizações internacionais como a já mencionada OMS ou a UNICEF apelaram urgentemente aos governos para que parem o aumento do consumo de alimentos ultraprocessados. Eles enfatizam que preencher as dietas com esses alimentos representa uma “ameaça sistêmica à saúde, à equidade e ao bem-estar das crianças”.
Pesquisa publicada Lanceta Liga o consumo habitual a um maior risco de obesidade, diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares e mortalidade prematura, e aponta para uma mudança acelerada nos padrões alimentares saudáveis, incluindo a dieta mediterrânica, para padrões dominados por alimentos altamente processados. Alguns países mediterrânicos, como Itália, Grécia ou Portugal, conseguiram manter o consumo de alimentos ultraprocessados abaixo dos 25%. Isto não se aplica a Espanha, onde excede 30%.
Tanto a OMS como a UNICEF apelaram a “políticas ambiciosas e regulamentações mais rigorosas” para criar um ambiente alimentar saudável. Hospitais e centros médicos, além de escolas e centros educativos, são áreas prioritárias para a implementação de medidas.
“As evidências científicas disponíveis são suficientes e justificam a tomada de medidas urgentes e decisivas para acabar com o consumo destes produtos e melhorar a saúde pública”, explicou Mayra Bes Rastrollo, professora de medicina preventiva e saúde pública na Universidade de Navarra e coautora do estudo. Lanceta em artigo no EL PAIS.
A meta-análise, que comparou dados de mais de 36 países através de uma revisão de 104 estudos publicados entre 2016 e 2024, “mostra que algumas das principais doenças crónicas que afetam a vida moderna estão associadas ao elevado consumo de alimentos ultraprocessados”, afirmou Jules Griffin, diretor do Instituto Rowett da Universidade de Aberdeen, numa declaração ao portal de ciência SMC.
O relatório faz repetidamente comparações com a indústria do tabaco, referindo-se a quando as empresas transformadoras tentaram suprimir as provas científicas contra elas em meados do século passado, com base na pressão de marketing e de lobbying. O mesmo acontecerá agora, explicam os cientistas, que apontam diretamente para o punhado de fabricantes que dominam o mercado, empresas como Nestlé, PepsiCo, Danone, Ferrero, Kraft Heinz e Coca-Cola.