dezembro 2, 2025
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A empresa organizadora do Festival de Banda Desenhada de Angoulême anunciou esta segunda-feira o cancelamento da 53.ª edição do concurso, cuja abertura estava prevista para 29 de janeiro, na sequência de um boicote dos autores e editores participantes. A decisão surge após semanas de polémica em torno do 9Art+, que afirmava que o festival “não poderia realizar-se nas condições adequadas”.

Mais de 2.000 autores anunciaram há várias semanas que não participariam da publicação para protestar contra a má gestão dos organizadores do evento. Eles acusam a 9Art+ de falta de transparência financeira e de demissão injusta de uma funcionária que no ano passado relatou ter sido estuprada por um funcionário do festival. As editoras aderiram ao boicote aos autores e há uma semana o governo e as autoridades locais anunciaram a retirada dos subsídios estatais à competição, que é financiada em 47% por estas receitas.

Esta é a primeira vez que este festival, o festival de banda desenhada mais importante da Europa e o mais prestigiado do mundo, é suspenso desde que se realizou em 1974, exceto no ano da pandemia. A decisão parecia inevitável há semanas, com o próprio prefeito de Angoulême, Xavier Bonnefon, admitindo que era “mais do que difícil”.

A 9Art+ organiza o concurso desde 2008 e o seu contrato foi prorrogado pelas próximas duas edições. Em comunicado publicado pela mídia local Charente grátisA empresa atribui o cancelamento aos órgãos governamentais responsáveis ​​pelo financiamento, “que não deixaram de participar da gestão privada do evento”.

A competição sobreviveu a outras crises, mas nenhuma delas foi suficientemente grave para levar ao seu cancelamento. A edição do próximo ano também está em risco, pois a sua organização depende da mesma empresa. A disputa também pode terminar em processo judicial, já que num comunicado da 9Art+, assinado por dois advogados da empresa, lembram que a gestão da edição de 2027 “pertence-lhe legalmente”, por contrato, até que “seja acordada uma solução que lance as bases para a transição para uma nova gestão do festival”. O presidente da Câmara de Angoulême, Xavier Bonnefon, disse na semana passada que “tendo em conta a situação”, é difícil realizar o evento em 2027 sob a liderança das mesmas pessoas”.

“Independentemente de qualquer enquadramento legal, os governantes usaram a sua influência para impedir a renovação do contrato privado que confia à empresa a organização do festival”, condenam os advogados Vincent Brenot e Ghislaine Minaire. Na passada terça-feira, o ministro da Cultura, Rachida Dati, anunciou um corte de 60% (cerca de 200 mil euros) nos subsídios que o Estado concede ao festival “devido a violações identificadas em termos de transparência”. Além disso, o concurso recebe apoio financeiro da região da Nova Aquitânia e do município de Angoulême.

Embora a empresa culpe as autoridades por terem causado esta situação ao retirar os seus fundos, os autores envolvidos no festival já há algum tempo denunciam a falta de transparência por parte da referida empresa. Culminou no ano passado com a demissão de uma funcionária que apresentou queixa de estupro. Em coluna publicada há mais de uma semana no jornal “Humanidade” Os 285 designers condenaram a “deterioração das condições de trabalho” no concurso e criticaram após o despedimento da referida trabalhadora que o seu “caso não é único (…). Há uma continuidade do sexismo e da violência sexual na profissão”, nota o texto.

Após um boicote de autores e editores, o diretor da 9Art+, Frank Bondoux, renunciou, embora sempre tenha negado as acusações de má gestão. Sua saída não impediu o cancelamento da competição. A decisão é um golpe para Angoulême, um município no sul de França conhecido pelo seu prestigiado festival de desenhos animados que atrai 200 mil fãs todos os anos.