Apesar do optimismo manifestado Donald Trump depois de uma reunião neste domingo em sua residência na Flórida com o Presidente da Ucrânia, Vladímir ZelenskyA ideia deixada pelo encontro entre eles é que um acordo de paz com a Rússia – algo que o americano busca há mais de um ano – não só não está pronto para ser assinado, mas, além disso, pode demorar muito para ser alcançado.
“Tive uma ótima conversa com Zelensky”, comentou Trump durante uma conferência de imprensa após a reunião. “Estamos 90% perto de chegar a um acordo”, disse o líder ucraniano.
O presidente dos EUA, Donald Trump, com o líder ucraniano Vladimir Zelensky
Se lermos os 20 pontos da nova proposta de paz (a proposta original acordada entre os Estados Unidos e a Rússia consistia em 28) e repararmos onde ainda não há acordo, a percentagem proposta por Zelensky está correcta: restam apenas alguns pontos por resolver.
O problema é que esses dois pontos não são anedóticos. Muito pelo contrário. Além disso: um deles – o que afecta a região conhecida como Donbass – é de vital importância para ambos os contendores. Por razões estratégicas, mas também simbólicas.
E, deixando de lado a anexação da Crimeia pela Rússia em 2014, a guerra que colocou os dois países um contra o outro desde então começou ali: no Donbass.
Zelensky, segundo os especialistas, não pode desistir do que a Ucrânia ainda retém – 30% do seu território – sem correr o risco de enfrentar uma revolta civil ou mesmo militar. E Putin, conforme explicado por especialistas como Marcos Galeotti com o EL ESPAÑOL ele só poderá assinar uma paz que possa vender como uma vitória na Rússia. Isto seria muito difícil com um pacto que não implique o domínio total no Donbass.
Outra questão sobre a qual ainda não existe acordo diz respeito à Central Nuclear de Zaporozhye. A instalação fica nas margens do Dnieper, muito perto da linha da frente, mas está em mãos russas desde Março de 2022. Kiev gostaria de recuperar o controlo da mesma para, entre outras coisas, evitar que o Kremlin a utilize contra a Ucrânia.

Garantias de segurança
Num outro aspecto que sempre preocupou Zelensky, nomeadamente as garantias de segurança provenientes dos Estados Unidos para evitar que a Rússia retome os ataques à Ucrânia após a assinatura da paz, parecem estar a ser feitos progressos.
Alegadamente Cristóvão Millercorrespondente Tempos Financeiros em Kiev e alguém com acesso directo ao Presidente da Ucrânia, os Estados Unidos ofereceriam uma garantia de segurança de 15 anos. Contudo, os ucranianos precisam de três vezes mais tempo para dissuadir futuras agressões russas, ou pelo menos o dobro do tempo.
“O presidente ucraniano pediu uma garantia de até 50 anos”, escreveu Miller numa crónica que mais tarde enviou ao seu jornal. “Zelensky teria dito a Trump que 15 anos seria um tempo muito curto para conter a Rússia no conflito que começou com a anexação da Crimeia em 2014.”
“Eu também disse a ele que gostaríamos de considerar a possibilidade de 30, 40 ou 50 anos”, acrescentou Zelensky durante conversa com um repórter. Até o momento em que este livro foi escrito, a Casa Branca não comentou o assunto.
Suposto ataque à residência de Putin
Após a reunião na Florida e a conferência de imprensa que se seguiu, uma questão ainda pairava no ar acima de todas as outras: qual seria o próximo passo de Putin? A especulação apontava para dois caminhos possíveis: ou participar nas negociações, tentando tirar delas o máximo possível, ou tentar boicotá-las.
Coincidentemente, esta segunda-feira, um dia depois de Trump e Zelensky se terem encontrado e de o primeiro ter dito coisas boas sobre o segundo, a Rússia acusou a Ucrânia de atacar uma das residências de Putin com drones.
“Este é um passo decisivo rumo a uma política de terrorismo de Estado”, disseram fontes do Kremlin. Eles também alertaram que o ataque forçaria a Rússia a “reconsiderar a sua posição negocial”.
Zelensky, por sua vez, garantiu que o alegado ataque é “uma invenção completa destinada a justificar novos ataques à Ucrânia”. Ele também pretendia justificar a relutância de Trump em continuar as negociações e, como resultado, dirigir a sua raiva noutra direcção.
Na verdade, como noticiou a agência de notícias russa há apenas algumas horas TASS citando um conselheiro do governo chamado Iuri UshakovAo saber do ataque, Trump pareceu “chocado e indignado” com a natureza “louca” do caso.

Yuri Ushakov e Vladimir Putin durante uma reunião com Steve Vitkov (de costas nesta foto).
Reuters/Sputnik
“Graças a Deus não lhes demos Tomahawks”, acrescentou o inquilino da Casa Branca, referindo-se aos mísseis de longo alcance que Kiev solicitou a Washington meses atrás.
Recorde-se que após o alegado ataque à residência de Putin este fim de semana, horas antes da reunião Trump-Zelensky na Florida, o Kremlin ordenou o lançamento de 500 drones e 40 mísseis – incluindo a classe Dagger – contra Kiev. O resultado: um dos ataques mais brutais que atingiu a capital ucraniana desde o início da guerra.