Joan Manuel Serrat diz que o seu exílio no México sob o regime de Franco foi um “tempo de pobreza”. “No sentido de que não escrevi praticamente nada, não escrevi nenhuma música”, esclarece. Foram tempos solitários, disse ele, em que teve de se agarrar a “fortalezas” como as que encontrou entre os exilados espanhóis no México. “Pessoas que me ajudaram a compreender melhor as coisas e a aprender”, disse a este jornal minutos depois de o Ateneo Español de México, instituição que preserva a história do exílio espanhol, o ter nomeado esta segunda-feira membro honorário. “É uma memória de tristeza, de tempo perdido, mas também de tempo lutado”, afirma o catalão.
Uma placa com seu nome agora está ao lado de outros ilustres membros da instituição. A manhã de segunda-feira foi uma cerimônia íntima e comovente. Foi um verdadeiro gesto para o cantor e compositor abrir um lugar na sua agenda para receber esta homenagem depois da agitação da Feira Internacional do Livro de Guadalajara (FIL), onde brilhou como uma das figuras mais esperadas e aplaudidas do encontro literário. Na cidade de Guadalajara também obteve seu doutorado. Causa Honorária da Universidade de Guadalajara (UdeG), e na segunda-feira relembrou algumas palavras que disse durante outra homenagem: “Que o México dos livros conquiste o México das armas e da violência”.
Ele disse isso olhando para a varanda da bela casa porfiriana que abriga a sede do Ateneo na Cidade do México. Foram dois grupos de coros infantis para os quais Serrat piscou: “Convido-os a aproveitar a oportunidade, aproveitar o tempo e o trabalho para construir para si o futuro de bons cidadãos de que sempre necessitamos”, disse-lhes. Estas crianças, alunos do Instituto Luis Vives e da Escola de Madrid, entretinham o artista cantando canções da Guerra Civil Espanhola, como aquela que lembra: “Se me queres escrever, já sabes a minha localização: na frente, na primeira linha de fogo”. Porque a memória da guerra estava presente, com a sua saudade da vitória e a dor da derrota. “Se a Espanha tivesse passado direto do 36º para o 37º lugar sem guerra, teríamos um futuro diferente, muito diferente daquele que tínhamos”, disse Serrat a este jornal.
Foi Alonso Leal, tesoureiro e membro legal do Ateneo, quem recordou durante a homenagem o que a música de Serrata representava para o exílio espanhol. “Foi parte integrante de nossa educação sentimental”, disse ele. “A sua data de nascimento indica que Juan Manuel Serrat nasceu e foi criado durante a ditadura franquista, e esta experiência o uniu e continua a uni-lo ao exílio republicano espanhol”, acrescentou e, como exemplo desta aliança, lembrou que em 1975 o governo mexicano condenou publicamente as últimas execuções da ditadura franquista e tomou uma série de medidas económicas contra o regime. “Serrat, que estava no México, condenou esses acontecimentos e expressou solidariedade ao presidente Luis Echeverría. Custou-lhe um ano de exílio em nosso país por causa do mandado de busca e prisão emitido contra ele pelo governo franquista”, lembrou Leal e acrescentou: “Assim, Serrat provou o pão amargo do exílio, como aconteceu com seus compatriotas há 36 anos, e ele mesmo admitiu que foi um período muito difícil de sua vida, porque vivia com “ansiedade constante” sobre se em algum momento o faria. ponto de poder retornar à sua terra.

Uma experiência partilhada de exílio que também foi recordada por Mariangeles Comesaña, vice-presidente do Ateneo. “Tenho um amigo que, desde adolescente, deu a mim e a toda a minha geração o privilégio de encontrar um lugar para realizar nossos sonhos”, disse ele. “Essas pequenas coisas, como são grandes nas ondas da sua música, Juan Manuel. Nas planícies da solidão, aquela que aparece aos 15 e 16 anos, quando éramos jovens, recorremos à sua voz, embalando a palavra no tempo de Antonio Machado, expressando o futuro inevitável que todos compartilhamos. Por isso é tão natural que a poesia de Machado encontre sua outra voz em suas melodias. São melodias que vêm do próprio profundezas, os versos flutuam no ar como bolhas de sabão, sem dúvida você transforma uma palavra em música e uma música em palavra”, disse ele.
Serrat aproveitou para passear pelos corredores e amplos cômodos deste casarão neoclássico. Viu sua placa na parede de honra e pôde folhear as páginas de um livro que preservava a memória dos navios que transportavam os espanhóis que desembarcaram em Veracruz. Ele então falou com este jornal.
Perguntar. Se você tivesse tempo agora para conversar com algum desses exilados, como exercício de imaginação, o que você lhes diria sobre a pátria perdida e a pátria encontrada?
Responder. Vivi aqui entre eles e conheci exatamente a amargura da pátria perdida, e não só a pátria, mas também a paisagem e o aroma, ou seja, uma perda total no exílio, que não sabe quando voltará. Mas é ainda mais profundo quando o exílio se perpetua ao longo de muitos anos e a necessidade do exilado saber que a pátria temporária não é apenas uma pátria temporária, mas a pátria do seu presente com todas as consequências que daí decorrem.
PARA. O que o exílio significou para você?
R. Este é um tempo de pobreza, no sentido de que não escrevi praticamente nada, não escrevi nenhuma canção. Fiz um esforço para me manter ativo para não perder a aderência que ainda me restava. E também tive a sorte de encontrar o apoio de pessoas espanholas exiladas no México com quem tive bons contactos. A família Taibo e toda aquela gente como Buñuel, como o (escritor Juan) Rejano, como o (roteirista Luis) Alcoriza, foram, enfim, muitas pessoas que me ajudaram a entender muito mais as coisas e a aprender.
PARA. O que essa placa significa para você?
R. Todas as placas aqui são resultado de tristeza, perda, tempo perdido, mas também, até certo ponto, de luta.