dezembro 19, 2025
2025121821531457717.jpg

Pela primeira vez em mais de duas décadas investimento estrangeiro direto na Argentina encerrou o período anual com saldo negativo. A informação provém de séries mensais elaboradas pelo Banco Central da República Argentina, que consolida os fluxos de capitais de empresas controladas por investidores não residentes e os expressa em valores constantes.

Uma mudança de sinal significa uma lacuna estatística. Entre Janeiro e Novembro de 2025, a conta de investimento directo estrangeiro acumulou saídas líquidas de 1.521 milhões de dólares, um resultado sem precedentes desde que registos comparáveis ​​começaram em 2003.

Fato inédito na série histórica

O comportamento recente contrasta com as médias positivas que caracterizaram os anos anteriores. Entre 2016 e 2019, o fluxo médio anual de investimento direto estrangeiro ultrapassou 3,2 mil milhões de dólares. Mesmo durante o período 2020-2023, apesar da pandemia e dos rigorosos controlos cambiais, o saldo manteve-se em território positivo.

A recuperação registada em 2025 não é uma resposta a um declínio acentuado no número de novos projetos, mas sim à escala dos desinvestimentos. As estatísticas do Banco Central contam como saídas de fundos associados à venda de empresas ou activos locais por grupos estrangeiros, mesmo que esses activos continuem a operar sob controlo nacional.

Venda de ativos e transferência de controle

Esse processo se reflete em diversas transações corporativas de alto perfil. Uma das mais significativas foi a venda pela empresa canadense Nutrien de uma participação na Profertil, uma das principais produtoras de fertilizantes do país, que passou para as mãos de acionistas locais.

Casos semelhantes repetiram-se em diferentes sectores, mas com um denominador comum: empresas multinacionais que decidiram reorganizar a sua presença regional e vender activos na Argentina como parte de uma estratégia global mais ampla.

Energia, banca e consumo são os setores mais vulneráveis

O setor energético concentra algumas das atividades de maior impacto. Com a criação da Vaca Muerta, diversas empresas internacionais iniciaram o processo de saída ou redução do risco de bilhões de dólares em vendas.

Retirada de tropas de Vaca Muerta e projetos estratégicos

Empresas como a ExxonMobil e a Petronas fizeram progressos na transferência dos seus activos locais. Em ambos os casos, as decisões estiveram relacionadas com alterações na alocação global de capital, critérios de rentabilidade e uma reavaliação do risco regulatório nos mercados emergentes.

Estas operações foram complementadas pelas ações de outras companhias petrolíferas internacionais que exploravam a venda de concessões ou a procura de parceiros para projetos específicos, cimentando um padrão de retirada parcial ou total de capital estrangeiro em áreas-chave.

Consumo de massa e serviços bancários

O fenômeno, conforme relata o Infobae, também atingiu o consumo de massa. A saída de uma subsidiária local da Procter & Gamble após a venda da sua unidade a um grupo argentino implicou a transferência de marcas, activos industriais e redes de distribuição que estiveram sob controlo estrangeiro durante décadas.

No sector dos serviços bancários e financeiros, um estudo sobre empresas de consultoria privadas concluiu que as organizações internacionais estão gradualmente a reduzir os riscos, quer através de vendas directas, quer através de reestruturações que limitam a sua área operacional.

Telecomunicações e Mídia

Em 2025 foi concluída uma das maiores transações do ano no setor de telecomunicações: a venda da divisão argentina da Telefónica para a Telecom Argentina. O negócio, avaliado em mais de 1,2 mil milhões de dólares, envolveu a transferência de controlo para um grupo de capital predominantemente local.

No sector dos meios de comunicação social, as empresas internacionais iniciaram processos de saída semelhantes. Algumas operações permanecem em negociação, mas seguem a lógica de desinvestimento regional e de otimização financeira observada em outras áreas.

Fatores locais e contexto global

As razões para um saldo negativo combinam fatores internos e externos. A nível local, as empresas citaram a incerteza macroeconómica, as restrições às transferências de lucros e a instabilidade regulamentar como elementos que influenciam a tomada de decisões.

Paralelamente, as empresas-mãe depararam-se com a necessidade de concentrar recursos em mercados considerados estratégicos, reduzir a exposição em países com elevada volatilidade e melhorar a eficiência e a rentabilidade.

Impacto do novo esquema de incentivos

O governo lançou um grande regime de incentivos ao investimento para inverter esta tendência e atrair projectos de grande escala. De acordo com estimativas privadas, esta iniciativa conseguiu abrandar a taxa de fuga de capitais, embora não tenha alterado o padrão de transferências de activos para capitais nacionais.

Os dados oficiais mostram que mesmo com a participação adequada de compradores internacionais nas fusões e aquisições, a maior parte dos activos vendidos pelas multinacionais permaneceu sob controlo local.

Mudanças estruturais no fluxo de capital

O saldo negativo do investimento direto estrangeiro registado em 2025 confirma a alteração da dinâmica dos fluxos empresariais. O IDE deixou de ser um puro canal de receitas em divisas e começou a reflectir em termos estatísticos a escala do desinvestimento acumulado.

O registro marca uma virada na estrutura empresarial argentina. Enquanto os ativos continuam a operar e a gerar atividade, a retirada de capital estrangeiro redefine o mapa de controle e abre um novo cenário para financiamento e investimento nos próximos anos.

Referência