dezembro 28, 2025
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A celebração neste ano de despedida de 2025 dos 150 anos do nascimento de António Machado tem levado à publicação de um sem-fim de elogios a várias facetas do poeta, já bastante conhecidas e famosas: são memórias de infância da corte de Sevilha, memórias de um republicano, memórias de um viúvo inconsolável, memórias de um homem bom… Mas não se pode aceitar o fim deste “ano sagrado Mahadiano” sem dizer o que parece essencial no poeta e na sua poesia; O que torna cada pessoa única e com a qual podemos aprender uma lição vital: Machado é um poeta que realmente se lembrou.

Ele argumentou que para que um poema nos toque, alcance nossa alma, nos faça vibrar verdadeiramente, ele deve estar relacionado a uma experiência real e vivida. Acredito que esta lição não se limita apenas ao campo da poesia, mas à vida em geral e até à própria vida social. Num presente em que os políticos Eles usam palavras exageradas como solidariedade, “sustentabilidade” ou “irmandade”. e falam de “cidadãos” de vez em quando sem realmente pensar em homens específicos e mulheres reais, o conceito de poesia de Machado pode ser mais do que útil e oferecer aplicação prática. Como isso pode ser útil para quem enche as redes sociais de poemas que parecem mais ou menos bons, mas que são instantaneamente esquecidos porque estão completamente vazios e não têm uma âncora que fique gravada na memória.

Pense, sim, nos seres de carne e osso, naqueles que perderam tudo na DANA e ainda não receberam ajuda, ou nos colegas de partido assediados sexualmente.. Pense, se estamos falando de amor, das pessoas que amamos em nossas vidas, e não construindo teorias vazias…

Voltamos a Machado, à essência de Machado e à sua definição de poesia como “palavras no tempo”, palavra que é antecipadamente “uma experiência no tempo” e “a memória dessa experiência”. Se o poeta nos fala do passado, deve referir-se a uma determinada memória e, ao falar-nos, reviver dentro de si essa memória.; não para pensar, mas para ver as imagens que evoca. Para Machado, não adianta falar abstratamente sobre o passar dos anos e o término da existência. Num texto conhecido, colocou na boca do seu personagem apócrifo Juan de Mairena algumas reflexões que vão nessa direção e distinguem a poesia do pensamento da poesia viva.

Para explicar a diferença entre um e outro, cita poemas de Jorge Manrique sobre a morte do pai e a verdadeira memória que guarda daquele tempo que se foi para sempre: “as senhoras, os seus chapéus, os seus vestidos, os seus cheiros, as armaduras que usavam…”. Ele contrasta os poemas que visualizam o ontem, que realmente existiu e cujo autor viveu na juventude, com um soneto desprovido de nostalgia, escrito por Calderon “Às Flores”, e que nos fala não de rosas reais, mas de rosas imaginárias, abstratas, frias: “Quando floresceram, as rosas nasceram cedo / e, envelhecendo, floresceram…”

Este exemplo corresponde à máxima romântica: “O mais profundo é o mais universal”. Toda a poesia de Machado nasce desta convicção: o que há de mais íntimo, íntimo, concreto e aparentemente indescritível é o que nos une a toda a Humanidade. E a felicidade ou a dor de uma pessoa é a felicidade e a dor de todas as pessoas.. Este princípio é usado para escrever poesia, votar leis e curar doenças. Se não pensarmos que o outro é como nós, nem a poesia, nem a política, nem a medicina são possíveis.

Referência