O acesso ao crédito tem sido historicamente um grande desafio para as pequenas e médias empresas (PME). Embora as grandes empresas tenham maior capacidade para diversificar as suas fontes de financiamento, as PME dependem fortemente dos serviços bancários e financeiros tradicionais. … Muitas vezes enfrentam condições mais duras. Neste contexto, as fintechs (empresas de tecnologia financeira) consolidam-se como um aliado significativo para cobrir parte desta necessidade de financiamento que os bancos comerciais nem sempre conseguem cumprir integralmente, seja por critérios de risco, custos ou falta de flexibilidade nos processos.
“As empresas Fintech estão a transformar o acesso ao financiamento para as PME com processos muito mais flexíveis e baseados em dados que podem fornecer respostas em minutos”, afirma André Martins, Head of Commercial Banking da NTT DATA. Alguns exemplos desta tendência são a Kabbage, especializada no financiamento rápido para PME nos EUA, ou a October, uma plataforma europeia de empréstimos empresariais com sede em França, que financiou milhares de empresas em vários países.
É esta combinação de velocidade e intensidade de dados que as empresas fintech possuem, diz Martins, que lhes permite oferecer financiamento mais personalizado, adaptado à forma como as empresas realmente se comportam. Esta abordagem é especialmente útil para empresas de rendimento variável, uma área em que a Clearco e a Vilcap provaram ser líderes. Além disso, acrescenta, estas plataformas estão a expandir as capacidades para além dos empréstimos bancários tradicionais, com fórmulas como factoring digital, adiantamentos de faturas, financiamento baseado em receitas ou BNPL B2B, enquanto intervenientes como Shopify Capital ou Stripe Capital estão a abrir novas oportunidades de liquidez.
“Por fim, destacam-se pela sua experiência digital e transparência, eliminando a papelada e simplificando a gestão financeira do dia-a-dia. Exemplos como Revolut Business e Qonto refletem bem esta simplicidade”, acrescenta o especialista da NTT DATA.
Marta Rifa, Diretora de Marketing da Qonto Southern Europe, explica que o principal valor diferenciador da fintech em comparação com o modelo bancário tradicional é a integração. Perante um ecossistema fragmentado, a empresa pretende centralizar as operações quotidianas das PME numa única plataforma, desde cobranças e pagamentos até à faturação, controlo de despesas e previsão de tesouraria. Esta abordagem reduz o atrito e aliviar a carga administrativaum problema que continua a afectar mais de metade das pequenas empresas em Espanha.
Vantagens
Este modelo integrado resulta em melhorias mensuráveis na transparência financeira, eficiência operacional e capacidade de resposta. Ao centralizar as informações, as empresas ganham visibilidade em tempo real do seu fluxo de caixa, reduzindo tarefas manuais e liberando tempo para crescimento. Rifa destaca que soluções como pagamentos móveis ou controle granular de despesas ajudam a melhorar o profissionalismo da gestão e facilitam o acesso ao financiamento, em linha com a flexibilidade e utilização de dados que se destaca no setor.
Em Espanha, o financiamento não bancário ganhou importância como complemento do crédito tradicional. Segundo o estudo “Financiamento alternativo das empresas espanholas”, em 2022 estes instrumentos serão destinados a mais de 1.170 milhões de euros a favor das pequenas e médias empresascom especial enfoque no factoring e no capital de risco. Apesar disso, a dependência dos bancos continua muito elevada, a tal ponto que, como alerta um estudo do Instituto Espanhol de Analistas Financeiros, em muitas pequenas empresas pode ser considerada quase total.
Coeficiente diferencial
E é aqui que a digitalização entra em jogo e se tornou uma alavanca fundamental para expandir o acesso ao financiamento. A Qonto estima no estudo que as PME digitalizadas acedem ao financiamento 77% das vezes, em comparação com 23% das não digitais, embora apenas 22% das empresas afirmem ter alcançado um elevado nível de transformação digital.
Apesar das conquistas do modelo fintech, o setor em Espanha continua a enfrentar desafios relacionados. A regulação é fundamental, explica Leire Celdran, CEO da Associação Espanhola de Tecnologias Financeiras (AEFI). Esta é uma área totalmente regulamentada tanto a nível nacional como europeu, o que obriga as empresas a adaptarem-se constantemente às novas regras, explica. Este processo requer recursos económicos e tecnológicos significativoso que terá um impacto particularmente sensível nas pequenas empresas, acrescenta o especialista.
Quanto à relação entre fintech e PME, Celdran acredita que continuarão a aproximar-se nos próximos anos “porque não podem dar-se ao luxo de avançar sem andar de mãos dadas”. “Além disso, essas relações beneficiam todos os intervenientes da indústria, desde os consumidores finais aos executivos. É claro que as empresas fintech não estão aqui para comer uma fatia do bolo dos bancos, mas sim para fortalecer a indústria através da inovação”, acrescenta.
Julgamento
Esta área é totalmente controlada e exige adaptação constante por parte das empresas.
Neste processo de convergência, Juan Alberto Sánchez, diretor do Mestrado em Blockchain e Investimento em Ativos Digitais do IEB, observa que os grandes bancos e instituições financeiras estão incorporando a inovação tecnológica diretamente nos seus modelos de negócio, não como unidades separadas, mas de forma ponta a ponta. Ele ressalta que não se trata mais de digitalização incremental, mas sim de mudanças mais profundas que impactam a produtividade e a competitividade, com tecnologias como a tokenização ou a inteligência artificial sendo integradas em áreas-chave como tesouraria, dívida ou garantias. Ele acrescenta que, em vez de criar empresas fintech independentes, as empresas tendem a adaptar estas soluções avançadas às suas próprias infraestruturas, bem como a confiar em ecossistemas externos para aumentar a agilidade.
“A colaboração e a sinergia com ecossistemas mais amplos (programas europeus, aceleradores, fundos especializados) são fundamentais para oferecer soluções bancárias integradas, em vez de trabalhar em silos”, afirma Fran Estevan, fundador e CEO da WeGrant. A estratégia, explica Estevan, visa agregar valor às empresas, automatizando processos complexos, como gestão de subvenções e ajudas, bem como facilitar projetos com capacidade de escala e acesso ao capital através de um modelo colaborativo.
Aliado
Os grandes bancos estão a introduzir inovações tecnológicas em todo o lado.
A principal barreira para muitas PME tomarem estas decisões é a ignorância, explica o CEO da WeGrant. Muitas empresas não sabem que ajuda está disponível ou como acessá-la, aumentando a complexidade administrativa. Esta combinação, observa ele, cria incerteza e, em última análise, atrasa decisões importantes, mesmo quando os projectos têm potencial de crescimento.
Os desafios aumentam nas empresas em fase inicial e nas PME, onde a falta de apoio especializado e de acesso a redes de apoio ainda é comum. Nestes casos, sublinha Estevan, a percepção de risco financeiro permanece elevada quando não existem mecanismos como adiantamentos, co-financiamento ou garantias. Sem esse apoio, acrescenta, muitas empresas optam por deixar de investir na inovação.
Tendências futuras
“As empresas Fintech estão evoluindo para plataformas financeiras completas, capazes de centralizar pagamentos, cobranças, cartões, faturamento e tesouraria em um único ambiente, semelhante ao ERP como paradigma de serviço”, afirma Martins da NTT DATA. Eles também fornecem uma visão única do negócio, consolidando transações, contas e despesas, levando a uma tomada de decisão mais rápida e a uma melhor conformidade, acrescenta. “O próximo passo é financiamento embutidoonde serviços como liquidez, adiantamentos ou seguros são oferecidos diretamente numa plataforma que a PME já utiliza. Juntas, estas capacidades posicionam as empresas fintech como um parceiro estratégico que simplifica as operações, melhora o controlo financeiro e facilita o acesso ao financiamento contextual, muitas vezes de forma mais eficiente do que os canais tradicionais”, conclui o especialista.