novembro 15, 2025
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Há dias que oferecem mais oportunidades do que datas. Dias que deveriam ser medidos não pelo que já fizemos, mas pelo que ainda podemos nos tornar. O Dia Mundial dos Pobres é um deles. Este não é um lembrete triste ou um gesto de boa vontade que desaparece à medida que a noite avança; Esta deveria ser uma ocasião coletiva para nos repensarmos, para reorganizarmos o que pensamos que sabemos, para nos perguntarmos o que significa hoje estar verdadeiramente perto daqueles que vivem em situações de profunda vulnerabilidade. Antes de tudo, é um convite para abrir portas.

Não se trata de insistir na crítica ou na condenação; Já ouvimos isso todos os dias e às vezes, sem querer, isso nos endurece. É mais necessário assumir o horizonte que este Dia oferece: uma oportunidade, um começo, um ponto de partida que nos permite ver a pobreza não apenas como dor, mas também como lugar de encontro e oportunidade. Uma oportunidade de incluir, de transformar, de ouvir, de acompanhar, de construir desde baixo o tecido que muitas comunidades começaram a reconstruir com paciência, criatividade e humanidade.

Quando falamos de pessoas pobres, estamos falando de indivíduos específicos. Nem sobre números, nem sobre categorias, nem sobre problemas abstratos. Estamos a falar de famílias que vivem no limite, de trabalhadores que não conseguem ganhar a vida, de migrantes que procuram um espaço seguro, de jovens sem oportunidades reais, de pessoas idosas que sobrevivem mais do que vivem. E falamos também, e às vezes não o suficiente, de quem vive privado de liberdade, de quem está em cativeiro não só por uma sentença judicial, mas também por uma cadeia de circunstâncias que começou muito antes de ir para a prisão: histórias de abandono, insegurança, silêncio. Além disso, tornar visíveis estes rostos é abrir um capítulo importante da dignidade humana.

Este Dia tem um poder simbólico, mas também a capacidade de contribuir para processos muito reais. Este é o dia de nos perguntarmos mais uma vez o que significa acompanhar hoje. Acompanhar não é apenas prestar assistência ou atender necessidades. Acompanhar significa participar, ouvir, caminhar ao lado, reconhecer capacidades, permitir que a pessoa seja protagonista e não objeto passivo de intervenção. Acompanhar significa compreender que o pobre não é o destinatário, mas o agente; Não é um problema, é potencial; Este não é um limite, mas uma oportunidade de encontro. Quando é prestado apoio genuíno, de pessoa para pessoa e de instituição para comunidade, abrem-se caminhos de mudança que nenhuma política isoladamente pode alcançar.

“16 de novembro é dia de se perguntar mais uma vez o que significa acompanhar hoje.”

Esta Conferência convida-nos também a repensar o trabalho, um espaço importante onde está em jogo a dignidade quotidiana. Trabalho decente é mais que um salário mínimo: é oportunidade de construir um projeto de vida, sentir-se reconhecido, desenvolver-se, participar. Sem trabalhar nos direitos e sem condições humanas, quaisquer esforços de inclusão permanecem incompletos. Aqui existe uma grande oportunidade para construir pontes entre setores que por vezes andam separadamente: empresas, sindicatos, instituições sociais, centros educativos, administrações públicas. Este Dia pode ser um momento privilegiado para assumir compromissos concretos: programas de recrutamento inclusivos, formação profissional para pessoas com histórico de exclusão, rotas de emprego dentro e fora das prisões, projetos de empreendedorismo social. Onde é criado trabalho digno, a pobreza diminui.

Mas a transformação não é apenas externa: é também mental, cultural, simbólica. Para que uma comunidade apoie processos de inclusão, deve primeiro estar disposta a olhar para a realidade de forma diferente. Ele precisa deixar para trás os clichês e estigmas que assolam os pobres e os prisioneiros. Devemos assumir que ninguém se constrói, que todos somos frágeis de alguma forma, que a vulnerabilidade faz parte da condição humana. O dia nos ajuda a desenvolver uma nova sensibilidade: ouvir antes de julgar, compreender antes de classificar, olhar antes de rotular. Quando as cosmovisões mudam, as decisões mudam. Quando as decisões mudam, a realidade muda.

Esta nova sensibilidade também abre a porta para alianças duradouras. Nenhuma instituição, por melhor que seja, pode sozinha alterar as condições que criam a exclusão. É por isso que este Dia pode tornar-se uma ocasião para reforçar a cooperação entre organizações civis, comunidades religiosas, universidades, administrações e empresas. Cada um deles contribui com algo diferente: alguns proporcionam intimidade e estrutura à comunidade; outros – profissionalismo e recursos; outros são pesquisa e avaliação; outros a capacidade de criar empregos. Sinergia multiplica resultados. Uma conferência pode tornar-se um ponto de encontro onde se delineiam horizontes comuns e se acordam passos concretos que vão além das boas intenções e se transformam em projetos sustentáveis.

“Trabalho decente é mais que um salário mínimo: é uma oportunidade de construir um projeto de vida, de se sentir reconhecido, de se desenvolver, de participar”

Mas há um aspecto ainda mais profundo: este Dia é um lembrete de que a pobreza desafia todas as pessoas, não apenas instituições ou governos. Ele nos convida a nos perguntar como podemos contribuir para nossa vida cotidiana. Às vezes pensamos que a mudança social exige grandes gestos, mas uma cultura de intimidade se constrói em pequenos movimentos.: consumo responsável, voluntariado bem planejado, escuta atenta, participação ativa nas iniciativas comunitárias, uma palavra de incentivo, um olhar digno. Este Dia lembra-nos que cada um de nós tem um papel a desempenhar, que todos somos necessários e que ninguém é pequeno demais para fazer a diferença.

O principal é não reduzir este dia a um momento específico. Sim, este Dia pode ser uma recordação, mas acima de tudo pode ser um impulso. Este pode ser o início de um ciclo de um ano de compromisso, avaliação e criatividade social. Talvez este seja o dia em que começaremos a transformar o episódico em estável, o atencioso em estruturado, o espontâneo em organizado. Esta pode ser uma oportunidade para reafirmar que a dignidade humana não é negociável e que o cuidado mútuo é a base de qualquer sociedade verdadeiramente humana.

“O que realmente muda uma história não é a intensidade de um único momento, mas a persistência com que permitimos que esse momento nos inspire a continuar.”

Se hoje abrirmos as portas, se hoje estendermos as mãos, Se ouvirmos hoje histórias que talvez nunca quiséssemos ou pudéssemos ouvir antes, já estamos fazendo a diferença. E mudar alguma coisa, mesmo que pequena, é o começo de mudar tudo. Este Dia chama-nos precisamente a isto: não a lamentar o que falta, mas a construir o que está por vir; não permaneçam no diagnóstico, mas tornem-se mestres do caminho; não olhar a pobreza de longe, mas aproximar-se, muito perto, dos homens e das mulheres que, como todos, merecem uma vida plena.

Se o Dia Mundial dos Pobres se tornar uma ocasião para reconsiderar a nossa visão do mundo, fortalecer as nossas mãos e expandir nosso coraçãoentão não será um dia. Este será um começo, um ponto de viragem na forma como tratamos aqueles que vivem em situações precárias. Um começo que nasce dos pequenos gestos, dos encontros concretos, das soluções visíveis, mas também das transformações internas que nos ensinam a olhar diferente.

Porque o que realmente muda a história não é a intensidade de um único momento, mas a persistência com que permitimos que esse momento nos inspire a seguir em frente. Se permitirmos que este Dia nos motive a apoiar processos, manter a intimidade e criar espaços reais de inclusão, então construiremos algo que perdure. E assim, dia após dia, talvez com passos modestos mas profundamente humanos, podemos transformar este início numa vida juntos, numa comunidade crescente e numa esperança que se expande para todos.