Quando o ditador português António Salazar recuperou da hemiplegia após um acidente em 1968, nenhum dos seus homens se atreveu a dizer-lhe que já não era primeiro-ministro. Assim, ele deixou o hospital para se instalar confortavelmente na residência. … oficial, não o outro. E, como quem não o quer, intervieram e acabaram por criar uma realidade à sua medida: começaram por disfarçá-la, obrigando-o a enviar correspondência falsa e obrigando-o a assinar documentos inúteis; Eles continuaram a receber conselhos de funcionários que não tinham mais funções, realizando reuniões fictícias em que todos fingiam diligência gravando para si comunicados de notícias falsos. Acabaram inclusive por publicar um único exemplar do jornal sob demanda (o diretor do Diário de Noticias, grande amigo dele, ia todos os dias de madrugada à gráfica para retirar todas as referências ao seu sucessor Marcelo Cayetano) ou contrataram atores para comemorar sua chegada em um carro da empresa para votar em eleições legislativas simuladas. E assim a farsa continuou até à sua morte em 1970. Outro dia estava a pensar em Salazar e nesta história maluca, observando a aparição do descompassado Pedro Sanchez, que comemorou com orgulho o seu sucesso e anunciou a apresentação de uma reportagem chamada “Campliendo”. Parecia-me um pequeno Salazar, tão alheio a tudo, chapinhando no seu mundo ideal, aquele onde tudo corre bem e todos o admiram e agradecem, messiânico e apolíneo aos seus próprios olhos. Indispensável. Aquele onde você está sempre ao seu serviço: Sara Santaolalla, que argumenta que se há cada vez menos trabalhadores independentes é um sinal de que a economia está indo como um tiro (melhor do que nunca), Oscar Puente, que, diante de acusações de assédio e abuso sexual em suas fileiras, diz que o que importa é a reação do partido (não das vítimas, que vulgar), Marta Flich, que, diante de mais um caso de corrupção, fala na televisão espanhola sobre as crianças roubadas há cinquenta anos (notícia maluca). TikTok recomenda livros e canções (Leire Diez e Vicente Fernandez presos), capa como pessoa do ano (19 empresas e vários ministérios estão registados na UCO), compromisso absoluto com o feminismo (outro, o presidente da Câmara de Bardabas, demite-se devido a assédio no local de trabalho e encobrimento de assédio sexual). Os seus, claro, como aqueles pretendentes portugueses empenhados em celebrar um sucesso tão grande só para o ver feliz. Que este governo trate bem a Espanha. A diferença (sutil, quase imperceptível) é que esses cortesãos ajoelhados criaram um número de vaudeville em torno de um convalescente decrépito que não queriam perturbar. Aqui ele próprio colocou um artefacto de ficção ao seu serviço, com a cooperação activa, claro, de prostitutas mediáticas dispostas e bajuladores interessados, tentando convencer o resto de nós a acreditar neles diante dos nossos olhos (e nos nossos bolsos). Fizeram-no pensar que ainda mantém esta posição, enquanto este se apega a ela e quer que acreditemos que é porque a queremos e para o nosso próprio bem. Se não tomarmos cuidado, Salazar somos nós, não ele.
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