Como é possível que não celebremos com grande alarde o centenário da fabada em lata? A invenção que salvou mais domingos preguiçosos do que o micro-ondas e o ibuprofeno juntos: celebramos aniversários menos justificáveis com grande alarde. Passaram-se cem anos desde que Campanal decidiu que era necessária uma versão portátil de um prato que naquela época já se tinha consolidado como o mais tradicional das Astúrias.
O livro conta a história de como a fabada alcançou esse momento definidor e icônico (talvez superado apenas pela lata de sopa Campbell's de Warhol) e o que aconteceu com ela desde então. Fabada. História e simbolismo do ícone asturiano. Nosso colega Pedro Suazua já falou sobre isso quando foi publicado há alguns meses, mas não podemos recomendar o suficiente suas 170 páginas, essenciais, engenhosas, cheias de dados, anedotas e fotos antigas bacanas. Bom ensopado cultural.
David Guardado, um dos editores e autores junto com Alicia Alvarez, conta que as vendas de livros vão tão bem quanto a fabada em dia de chuva. “Vemos muito interesse entre os asturianos no estrangeiro”, afirma, convencido de que neste Natal haverá muitos presentes. “A Fabada nas Astúrias está num pedestal, mas por outro lado, a imagem associada à “avó fabada”, uma pergunta humorística, tem muito peso”, afirma David, que defende que “de alguma forma, através do livro, penso que estamos a devolver à fabada um pouco da forma como esta imagem lhe foi tirada”.
Depois de cem anos de fabadas enlatadas, é hora de trazer de volta as que ainda estão fermentando. A Fabada está mais viva do que nunca e pedimos aos editores e à equipe do livro que indicassem os locais aos quais peregrinam para comê-la. Há outra lista à qual você pode adicionar seu favorito na seção de comentários.
Casa Baizán resistindo à gentrificação
Alicia e David escolhem a Casa Baizán em Gijon/Quijon porque “têm uma fabada deliciosa”. Este local não consta das listas das melhores fabadas e não é presença habitual nos concursos deste guisado. Além disso, é um restaurante tradicional que passou por uma gentrificação gastronómica, no coração da cidade, rodeado de cadeias de hambúrgueres e cozinha asiática. “Vamos acabar comendo cozinha internacional e é preciso preservar a cozinha tradicional”, afirma Flor Ortea, responsável pela cozinha e de quem somos automaticamente fãs. Ele segue uma receita de família que “não tem segredos, apenas ingredientes de qualidade e muito amor no preparo”. Além da receita tradicional, a fabada com Pantrukque é um ingrediente típico da zona oriental das Astúrias, de onde era natural a sua mãe: “São bolinhos de farinha de milho com toucinho, páprica, ovo e salsa, que, sem serem fritos, são colocados na fabada, sugam a gordura e engrossam o caldo”. Isso precisa ser verificado.
Casa Baizan: 4º andar, Calle Corrida Bajo Derecha (Gijon, Astúrias). Tel. 985 172 745. Mapa.
Casa Generosa, um passeio com final feliz
No livro em análise, a historiadora e publicitária Arantsa Margolles escreve sobre a evolução da fabada como atração turística. Não admira, portanto, que recomende a Casa Generosa, situada numa pequena localidade do concelho de Quiros, no coração das Astúrias. “Este é um dos locais mais secretos onde os asturianos comem fabada”, diz-nos, “mas acho que vale a pena conhecer”. Para chegar a este restaurante tem duas opções: ser cobarde e conduzir ou atravessar a estrada Las Xanas, “que é facilmente transitável e passa por Torreón de Peñerues, um dos pontos mais pitorescos das Astúrias”. Sempre para passeios com recompensa final em forma de comida deliciosa.
Na Casa Generosa, Enedina Garcia passou 74 dos seus 80 anos atrás do fogão. Ela é a rainha da gastronomia popular e brinca com o sucesso de sua fabada: “Como é que não comem enquanto se batem enquanto caminham”. Afirma não ter segredos na hora de o fazer, embora revele que são eles próprios que fazem o compango em casa, “o que lhe dá valor”. Aqui pode comer à la carte por 20 euros durante a semana e 22 euros ao fim de semana, e há sempre muita fabada por onde escolher.
Casa Generosa: Praça Pedrovea, 16, (Pedrovea, Astúrias). Tel. 985 783 046. Mapa.
Casa Cristina, o segredo está na morcela
Vamos usar outra fórmula vencedora: Casa + nome da gizandera + cardápio incluindo fabada. Em Teyego, no município de Ribera de Arriba, muito perto de Oviedo, fica a Casa Cristina. “Uma casa de gizander sem truques, fora do comum e com fluxo constante”, segundo um especialista em alimentação marketing gastronômico e agroalimentar Luis Nel Estrada. No livro, ele fala sobre novas formas de fabada e chega à conclusão de que a melhor forma de encontrar um bom restaurante é o boca a boca.
Rosa Palicio substituiu a mãe, Cristina, na cozinha há quatro anos. Oferece um menu de 25 euros em que a estrela é a fabada, escrita em metade dos cem pedidos que chegam à cozinha todos os dias. Sobre sua receita, ela diz que o chouriço é fundamental porque “dá mais sabor” e por isso encomenda a um fabricante que faz do jeito que ela gosta.
Casa Cristina: La Pruvía, número de série (Tellego, Astúrias). Tel. 985 796 251. Mapa.
Casa Yoli, receita da vovó.
Uma das principais descobertas do livro Fabada. História e simbolismo do ícone é que antecipa em dez anos a data em que a fabada é mencionada pela primeira vez. Foi noticiado no jornal Ordem em 1874, e não em 1884, como se acreditava anteriormente. Mas, como aponta o historiador Xuan F. Bas em suas páginas, a primeira receita só foi publicada em 1909 e não incluía chouriço. Aqui estão mais informações para ajudá-lo a vencer seu genro no próximo jantar em família.
Xuan admite que não gosta de comer fabada fora de casa porque seu pai faz com que seja “ótima”. Mas quando chega a hora da reunião familiar, celebram-na na Casa Yoli, em Deva, uma das mais belas freguesias de Gijon, e comem batatas com feijão, chouriço, morcela e bacon. Juan Manuel Caso assume as rédeas deste lendário local de piquenique, que remonta a quase 125 anos. “A receita da fabada é da minha avó e não há mais mistério nela do que bons ingredientes e um pouco de cuidado”, conta-nos, antes de nos lembrar que o prato é servido na hora, embora alguns dias tenhamos sorte e o encontremos no menu.
Casa Yoli: Carr. de Caldones, 182 (Virgem, Astúrias). Tel. 985 368 724. Mapa.
La Maquina, generosa com compango
Vamos a Lugones/Llugones, no concelho de Siero, para ver como se prepara a fabada em La Maquina, local onde o historiador José Luis Carmona convida sempre para comer os visitantes que recebe de fora das Astúrias. “O que me agrada é que o compango seja servido junto a um prato de feijão, em vez da tendência agora de juntar uns pedaços de chouriço e morcela”, defende, e aqui somos todos a favor de tudo o que não seja uma bolacha.
Ramon Gonzalez dirige o restaurante e recorda com orgulho como a sua avó Maria ia ganhar um concurso de comida regional nos anos sessenta do século passado, no qual defendia as cores das Astúrias, cozinhando, claro, fabada. “A partir desse momento especializámo-nos neste prato e representa mais ou menos setenta por cento dos pedidos que recebemos todos os dias”, conta-nos, antes de repetir a constante desta reportagem de que a receita, que prepara há décadas, “não tem segredo”. Embora lhe digamos que atribui “grande importância” à faba, que “deve ter um sabor bom e ao mesmo tempo ser macio”. Algo, disse ele, “é muito difícil de conseguir”.

Carro: Av. Conde Santa Bárbara, 59 anos (Lugones, Astúrias). Tel. 985 263 636. Mapa.
Casa Eladia: grande faba, caldo rico e um toque picante
O livro explora o estado atual da fabada do foodie e criador do blog Les Fartures, David Castanon, que conclui que é raro encontrar um restaurante ou lanchonete nas Astúrias que não sirva fabada. Você já experimentou a maioria deles, então estamos interessados em escolhê-los. Escolha a Casa Eladia em Rosaes, uma pequena cidade de Villaviciosa: “Fabada de primeira, uma das minhas três melhores. Faba grande, azeite puro, com caldo grosso. O compango é de primeira classe, com um tom picante de morcela que permeia todo o prato.”
O ingrediente é o chouriço, ao qual Paula Sopenya dá grande importância. “Se estiver ruim estraga a fabada, se for mal defumada e Rancho Até muda a cor do caldo”, explica a chef desta loja de chigra, uma das poucas que restam nas Astúrias. Também lhe perguntámos sobre os segredos da sua receita, e ela surpreendeu-nos ao garantir-nos que o segredo é não prestar muita atenção ao preparo: “Coloco tudo lá dentro, e quanto menos olho, melhor fica. Tem gente que assusta com água fria, mas eu não faço nada disso. Só adicionei açafrão no final.” Fa-chi-li-si-mo.
Casa de Eladia: BB-10, 23 (Villaviciosa, Astúrias). Tel. 665 965 605. Mapa.
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